segunda-feira, 9 de julho de 2012

AS FLORES


As flores são polígamas
e fazem poesia em vez de sexo
– as que são…,
as que não, retraem-se em acanhamento,
suscitam ópio,
recitam-se mudas na sombra…

Quando para os olhos
referem falsas opulências esmaltadas
de carnalidades inocentes,
constituem tenras imortalidades…
Quando não,
demoram-se secretas,
tão invisivelmente temporais,
tão finamente vigentes…
– flores não se misturam com gente!

E, no artifício da pele,
contraem pigmentações deixadas
por passarinhos
em seus esvoaçamentos rituais…

Inclinadas à ressurreição, as flores,
nutrem-se com restos de coisas de chão.

Os insetos são incestuosos e as fazem
negligenciar a exuberância do gozo.
As flores são seres reluzentes. 

DESLEMBRAMENTOS


Nem tudo o que vivenciei recordo,
muito se perdeu nos estreitos da memória,
diluído pelo dilúvio de novidades
contínuas em profusão estonteante.

Algumas visões teimam em vislumbrar:
resquícios de pesadelos povoando de sobrenaturalidades
as sombras dos dias tão cheios
de deslocamentos e barulhos;
rápidas impressões que não cessam de espocar
seus fogos de artifício
como em um eterno Réveillon;
fragmentos do cotidiano, invisíveis,
supostos na dura permanência das coisas.

Só o amor fez falta. É fato.
Única recordação severa.
Retratado nas velhas fotos
o amor falsificado vigeu.
Não escapou, contudo,
o sorriso amarelo do homem pardo,
alado, ao lado de outro pardo
e semblante átono.


No entanto,
nenhuma saudade amarga ressalta agora.
A ilusão com suas asas gigantescas
cumpriu papel impermeável
de proteger a carne do espírito e vice-versa.

O pouco que ficou, fincou
garras e fez sobreviver o menino
em meio a bolas de gude,
um caleidoscópio e outras tralhas
– apesar dos pesares.

A memória nunca fora exigente,
futurava agônica
pelos vergéis de pedra e cal um deleite fortuito, apenas.
Nem que eu quisesse
remontar de lembranças minha vida atual
não haveria como pontuá-las. 

MINEIRICE


Idalina
moça
mineira
espirituosa
doida pra dar
e daí
mas por falta de homem
ria-se do seu azar

ria Idalina
moça mineira
de Montes Claros
de olhos esverdeados
loucura de dar inveja
além de rir e rir-se
vivia correndo atrás
com a mesma alegria grená

segunda-feira, 2 de julho de 2012

VERDES VERDE




Verdes os enganos – e ainda bem que cedo.
Verdes os encantos – e ainda bem que ledos.
Verde será sempre a esperança.
Verdes como todos os segredos devem ser
São olhos repletos de atalhos e nuanças.
Verdes…

Lá em casa:
A garrafa térmica,
O porta-guardanapos
E o pano de pratos – também são verdes. 

domingo, 1 de julho de 2012

DE DIA


à luz do dia
à noite
toda hora é hora
e há quem diga:
se for à noite – como se não fosse
parte do mesmo dia

por dentro vento e calmaria
sol e lua e estrelas
azul e negridão
manhã
meio-dia
tarde
meia-noite
madrugada:
tudo na mesma barriga
um dia não é só de dia
é de noite também

meio-dia – metade do dia
um dia tem fases como a lua
cheio de dia
de noite esvazia

agora de dia
mais tarde
em qualquer fase do dia

durmo de noite
como de dia